quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Acho que só não escrevo mais porque não sei escrever simples. Absolutamente todos os dias me ocorrem grandes frases – bons amontoados de palavras, ao menos –, mas nem assim eu consigo transferi-las ordenadamente pro papel, cruas do jeito que nasceram. Da mesma forma que todo santo dia, em cada curva da estrada, eu tenho a nítida certeza de que VAI bater, ou que na próxima descida o freio NÃO VAI agüentar; Ainda assim, nunca bate, ou o freio dá conta, e eu sempre chego ilesa.


Não, não é uma tendência suicida mal reprimida, eu ainda quero, uma vez que seja, escrever – uma página ao menos – sem olhar no dicionário. E dane-se que um assunto não tem nada a ver com o outro, em mim nada se separa. É tudo um bolo só: angústia, saudade, contentamento, tristeza, serenidade, indignação e impaciência.


Eu tenho é vontade de quebrar todos os relógios do mundo, trapacear o tempo, pra nunca mais me sentir impotente ante a algo que ninguém sequer vê. Tempo é só um negócio que a gente sente: na pele, nas articulações, nas veias congestionadas, nos lapsos de memória. É simplesmente revoltante o fato de a minha vida – a de todo mundo, na verdade – ser regida por esse monstro abstrato e covarde, que ataca pelas costas e sempre foge, sem nos dar a mínima oportunidade de capturá-lo.


Foi esse bandido quem desfigurou minha caligrafia, inclusive. E foi também ele quem, ao seu longo, me fez cética, descrente, descoordenada, desmemoriada. Quase insana, afirmam fontes fidedignas [ok, o ‘quase’ foi por minha conta. Alguém nessa história deve se pronunciar em minha defesa, afinal]. Não bastasse isso, teve a audácia de me amolecer, pois eu já fui sim muito mais cruel com os seres humanos do que sou hoje; Roubou meu sono, consequentemente também minha saúde, minha paciência, e acho que tudo isso apenas pra eu nem sentir quando ele por fim me tomar a vida.

8 comentários:

nirah disse...

Rá!
O tempo...
É, ele é culpado de tudo...
bem sei...

Jury Antonio Dall'Agnol disse...

Meu problema com o tempo é que quando surgem as grandes frases eu já esqueci...ficam as pequenas frases.

lindos seus textos!

JD

Karol disse...

O relógio é o grilhão que me arranca os míseros segundos de satisfação. O tempo machuca.
Belo texto.

Beijo

Arobed Omissirev disse...

"Da mesma forma que todo santo dia, em cada curva da estrada, eu tenho a n�tida certeza de que VAI bater, ou que na pr�xima descida o freio N�O VAI ag�entar; Ainda assim, nunca bate, ou o freio d� conta, e eu sempre chego ilesa."

e se eu disser que sempre penso o mesmo tipo de coisa nos trajetos di�rios da vida? achei que essa maluquice era s� minha...
as vezes chego a pensar que n�o tenho UM anjo da guarda, mas uma legi�o deles porque nada acontece (fisaca, emocional ou psicol�gicamente) que consiga me ferir o bastante pra fazer desistir...
talvez seja s� impress�o, talvez sejamos protegidas da vida e do acaso, talvez seja s� uma incapacidade gen�tica pra admitir incapacidades, fraquezas e dificuldades... vai saber n�

Anônimo disse...

Você ainda não passou da fase "mamãe, olha, fui eu que escrevi!". Na etapa seguinte o dicionário fica longe, a gramática sangra e você se liberta. A terceira, sim, é a ambição de todo escritor: palavras feias tecendo uma redação bonita.
Temos tempo, vai. Abrace o relógio e dance La Cucarracha com ele.
=*

Guilherme Lima disse...

Aeee. Atualizou o blog heim...rs. Bom texto, mas o tempo é assim mesmo senhor das horas. "Eu já quis ter um dia um equipamento que me fizesse viajar no tempo(pra quê?). Eu tenho vários argumentos, nunca mais eu sentiria arrependimento, eu saberia os resultados antes do planejamento eu manteria as contas em dia, mesmo depois do vencimento".

Quanto a qualidade do texto, está excelente, quem dera eu conseguisse escrever as coisas exatamente como eu penso. Mas quando pego o papel e a caneta não consigo, o pensamento foge e o texto perde o encanto. Tudo bem, eu vou tentando.

Abraço.

Arobed Omissirev disse...

editadora coompulsiva on?

Anônimo disse...

Eu quero texto novo! *faz beiço*